Autor de ofensas contra a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, o senador Plínio Valério (PSDB-AM) acumula embates com ambientalistas em sua atuação no Congresso. Presidente da CPI das ONGs, o parlamentar assumiu nos últimos anos o papel de principal adversário de organizações que atuam na Amazônia.
Durante sessão desta terça-feira da Comissão de Infraestrutura do Senado, Marina deixou o colegiado após Valério dizer que separava a mulher da ministra porque a primeira merecia respeito e a segunda, não. A ministra disse que só continuaria na comissão se houvesse um pedido de desculpas. Ele se recusou a fazê-lo.
Em março, Plínio já havia dito ter vontade de enforcar Marina em um evento público da Fecomércio do Amazonas.
Continua depois da publicidade
À frente da CPI das ONGs, Valério acusou, no ano passado, organizações de atuarem como um “poder paralelo” na Amazônia, recebendo recursos sem prestar contas adequadas.
Em uma audiência, afirmou que o Brasil era “dominado por quem tem dinheiro”, referindo-se a ONGs que, segundo ele, “fazem o trabalho sujo” para isolar populações locais. Valério também critica frequentemente conferências internacionais sobre mudanças climáticas.
Em 2022, criticou a COP 27, afirmando que esses eventos são “palcos para autoridades políticas que desejam apenas plateia”. Um ano depois, criticou a COP 30, que acontecerá neste ano em Belém, alegando que os resultados seriam “superficiais, ineficazes e repetitivos”.
Continua depois da publicidade
Em plenário, o senador já mirou a ministras outras vezes. Em abril deste ano, por exemplo, criticou fala de 2010 da ministra que considerava a BR-319 sem importância.
“Enquanto ela (Marina) destratar os amazonenses, enquanto ela ironizar os amazonenses e gozar deles na cara, eu vou ter que repudiar aqui, sempre. A última foi que a estrada BR-319 não liga lé com cré, reportando lá aos anos 70, àquelas músicas. Portanto, a ministra Marina vai receber de mim, sempre, com veemência, a discórdia, vou discordar sempre, e o repúdio.”
No mês passado, voltou a criticar a atuação de órgãos ambientais, como o Instituto Chico Mendes (ICMBio).
Continua depois da publicidade
“O ICMBio, lá no Amazonas, acaba de detectar uma área, fazer estudo, inventar audiências públicas só entre eles e reservar uma área equivalente a 15 mil campos de futebol para cuidar do sauim-de-coleira, que é um pequenino animal, que merece, sim — respeito todos os animais —, mas que não precisa de tanto. E agora está criando uma outra área no lugar onde se planta, no Município de Apuí.”
Durante sessão desta terça, Valério iniciou o embate ao dizer que não respeitava a ministra. Eles debatiam sobre a pavimentação da BR-319, estrada que liga Porto Velho a Manaus.
“Ao olhar para a senhora, eu estou vendo uma ministra, não estou vendo uma mulher. A mulher merece respeito. A ministra, não. Por isso eu quero separar”, disse Valério, nesta terça.
Continua depois da publicidade
Marina, então, se retirou da comissão afirmando que não havia respeito por parte do parlamentar, já que havia sido convidada como ministra.
“Eu fui convidada como ministra, então tem de respeitar. Eu me retiro porque eu não fui convidada por ser mulher”.
Ao sair da comissão, Marina citou o episódio em que o senador Plínio afirmou em março que tinha vontade de enforcá-la. A ministra citou ainda os embates sobre a nova Lei de Licenciamento Ambiental, aprovada pelo Senado na última semana, e que não poderia ter tido outra atitude que não fosse deixar a comissão.
Continua depois da publicidade
“Ouvir um senador dizer que não me respeita como ministra, eu não poderia ter outra atitude. Ele é uma pessoa que disse que da outra vez que eu vim aqui como convidada foi muito difícil para ele ficar 6 horas e dez comigo sem me enforcar, e hoje veio de novo para me agredir…. Além de pessoas que atribuem a mim responsabilidade que são deles. Dizer que a demolição da legislação ambiental praticada pelo Senado, com relatório aprovado, é responsabilidade minha é não querer honrar o voto que os elegeu. Quem tem mandato de Senador e deputado vota pelas convicções que tem, não porque alguém obrigou.”
Ao sair da comissão, Marina entrou em uma reunião com o presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), para tratar sobre o projeto de licença ambiental que agora será debatido pela Câmara.
Ela afirmou ter sido vítima de violência política de gênero e que avalia medidas jurídicas contra o senador Plínio.
“Com certeza isso acontece com a gente [mulheres] o tempo todo. Eu me senti agredida fazendo o meu trabalho. […] A gente sempre tem de avaliar o que é nosso direito e não abrir mão do nosso direito. A manifestação do senador, que disse que é muito difícil não me enforcar, eu já estava avaliando a situação com os meus advogados. Ele agravou a situação.”
O senador Rogério Carvalho (PT-SE) foi um dos poucos senadores a defender a ministra no microfone durante o bate-boca:
“O debate político pode ser caloroso com divergência. Agora, manifestação de desrespeito é inaceitável. Quando alguém começa um debate dizendo que respeita a mulher, mas não respeita a ministra, isso não cabe em um debate institucional.”
Após o encontro com Motta, Marina afirmou que pediu ao presidente da Câmara que o projeto de licenciamento ambiental seja analisado com calma e que setores sejam ouvidos ao longo da tramitação. O parlamentar sinalizou que vai conhecer a matéria e realizar diálogos antes de tomar uma decisão.
“Ontem entrei em contato com o presidente Hugo Motta para pedir audiência a fim de que esse relatório aprovado no Senado, que não foi debatido, para que tenha o tempo necessário de debate e conhecimento dos diferentes setores da sociedade. Para que haja o tempo necessário da democracia e transparência do que está sendo votado sobre o licenciamento ambiental, que ha décadas conseguiu se firmar e infelizmente agora está sendo amputado em relação a questões estratégicas, como a diminuição do papel dos órgãos colegiados, como o Ibama.”