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Os povos originários na visão dos museus – 25/04/2025 – Txai Suruí

Ao pensar em museus, eu costumava associá-los ao passado —um lugar que visitamos para conhecer o que já não está mais presente. Também os via como espaços de perguntas, onde buscamos entender a história de algo ou de um determinado momento.

Mas, como mulher indígena, essa experiência sempre foi atravessada por um desconforto. Para mim, os museus pareciam extensões do processo colonial: espaços onde objetos roubados são exibidos sem consentimento e, muitas vezes, sem compreensão de seu verdadeiro significado. Penso, por exemplo, nos artefatos de diversos povos e países expostos em instituições renomadas, como o Museu Britânico, em Londres.

Os museus também são locais de arte —mas, historicamente, uma arte elitista e excludente. Por muito tempo essas instituições foram vistas assim. Até meados do século 20, seus critérios administrativos e de aquisição eram arbitrários, marcados por visões colonizadoras e seletivas. Na década de 1970 esse conceito começou a mudar, dando início à chamada museologia moderna. Várias redefinições foram propostas na tentativa de contemplar a diversidade de museus, coleções, públicos e territórios.

Em 2022, houve uma mudança significativa: pela primeira vez, termos como “inclusão”, “acessibilidade”, “sustentabilidade” e “ética” passaram a integrar a definição oficial de museu.

Estive na França com o líder guarani Thiago Karai Djekupe para dialogar e difundir o papel da arte indígena na luta dos povos originários. Palestramos na Escola de Belas Artes de Lyon e na Escola Superior de Arte de Avignon, mostrando como a arte tem se tornado instrumento fundamental de denúncia das violações de direitos e também uma forma potente de compartilhar a cultura e a riqueza dos nossos povos.

Visitamos museus e tivemos uma aula com o diretor do Museu de Artes Africanas, Oceânicas e Ameríndias (Maaoa), que expôs as transformações pelas quais essas instituições têm passado.

Museus do mundo vêm tentando construir uma nova ética relacional, baseada no diálogo e na conexão em níveis local, nacional e internacional. Um marco disso se deu em 2012, quando 20 restos de ancestrais māori —incluindo uma cabeça mumificada preservada pelo Maaoa— foram devolvidos por museus franceses a indígenas da Nova Zelândia.

Essa mudança parte do desejo das instituições de estabelecer relações respeitosas com as comunidades e suas diásporas, locais de origem das coleções. Também exige transparência: tanto nos métodos de trabalho quanto na abordagem histórica e cultural.

O diálogo com os próprios povos tem gerado resultados enriquecedores, capazes de corrigir e aprofundar o conhecimento sobre os objetos expostos. São processos que respondem a questões éticas, filosóficas, espirituais e históricas, nascidas da indagação desses povos que agora ocupam espaços legítimos de interlocução na museologia, nas ciências, no direito, na arte e na história. São exemplos a serem seguidos pelos museus do Brasil.

A Dinamarca devolveu ao Brasil o Manto Tupinambá. Mas o Brasil continua se recusando a devolvê-lo aos seus verdadeiros donos: o povo tupinambá.


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