O otimismo não anda em alta. Desde Voltaire, que em “Cândido, ou o Otimismo”, de 1759, satiriza a filosofia então em voga de que este é o melhor dos mundos possíveis, o otimista carrega a pecha de ser um tanto tolo. Se o jovem Cândido precisou atravessar infortúnios pessoais, guerras e catástrofes naturais para concluir que o mundo não é guiado por um propósito positivo, três séculos depois vivemos um momento de extremos em que fica difícil enxergar o presente e o futuro sem os óculos do ceticismo.
No entanto, nem com o otimismo dos tolos, nem com a desesperança dos cínicos, seremos capazes de dar conta da nossa sobrevivência —a da nossa geração e a das nossas crianças– diante dos graves riscos sistêmicos que ameaçam o nosso mundo. O próprio Voltaire termina a saga de seu personagem fazendo com que ele decida agir –mesmo que seja para, simbolicamente, cultivar o jardim.
Já falamos aqui dos riscos sistêmicos, aqueles que afetam as economias globais como um todo e podem se encadear perigosamente rumo ao colapso. O Global Risks Report 2025, do Fórum Econômico Mundial, elenca entre os dez maiores, no prazo de dois anos, a desinformação, os eventos climáticos extremos, os conflitos armados, a polarização, a desigualdade social e a cibersegurança.
A governança do risco sistêmico exige um nível de cooperação multilateral para os quais os atuais modelos não estão preparados. Isso já entrou na pauta de urgência de governos, empresas e sociedade civil, e, para além das medidas de mitigação, o que está em jogo é a nossa capacidade de usar a inovação e a criatividade em prol de uma coletividade que possa superar e não desencadear os riscos sistêmicos. É necessário manter o otimismo teimoso.
O conceito é da economista costa-riquenha Christiana Figueres, uma das articuladoras do Acordo de Paris. O otimismo teimoso é a escolha consciente de, mesmo sabendo de todas as dificuldades, agir como se a transformação fosse possível –e, assim, criar as condições para que aconteça.
Uma experiência prática desse conceito foi vivida por outra grande mulher à frente das negociações do Acordo de Paris, a diplomata francesa Laurence Tubiana. Exausta, sem dormir, ela estava numa discussão tensa com os países mais resistentes quando, simplesmente, começou a chorar e disse: “Isso é o melhor que consigo fazer”. A sinceridade e a profunda humanidade daquele choro foram decisivas para que os líderes entendessem a dimensão de coletividade do acordo que, enfim, foi selado.
O otimismo teimoso se complementa com o otimismo informado, aquele que parte do conhecimento dos problemas para gerar as soluções. O psicólogo e linguista canadense Steven Pinker costuma trazer uma perspectiva histórica, mostrando que os avanços da humanidade precisam ser conhecidos e reconhecidos. Ele exemplifica com dados, que, mesmo com as ameaças atuais à democracia, o mundo está melhor do que há 30 anos. E que não reconhecer isso é pernicioso, porque nos faz não acreditar e não querer melhorar as instituições democráticas.
Frente a todos os riscos, a capacidade humana de sermos teimosos é estratégia de sobrevivência. É o que nos desafia a usar o conhecimento, os recursos e as tecnologias disponíveis para fazer as escolhas certas e agir —colocando o bem público e a coletividade no centro das decisões.
O tempo está correndo: mãos à obra!
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