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Eventos climáticos extremos perpetuam desigualdades – 13/05/2025 – Lorena Hakak

Muitos devem se lembrar das imagens que aparecem nos noticiários quando algumas regiões são afetadas por secas prolongadas. Em muitos casos, os homens acabam migrando para as cidades em busca de trabalho, deixando suas famílias na região de origem. As imagens mostram mulheres jovens e idosas rodeadas de crianças, em contextos marcados por grande insegurança alimentar e hídrica. Essas mulheres, as principais cuidadoras desses lares, precisam buscar água e alimentos cada vez mais longe, e contam com menor capacidade de geração de renda.

Todos nós sentimos os impactos ao presenciarmos um evento climático extremo, como ondas de calor ou enchentes, por exemplo. Os efeitos, muitas vezes, são devastadores. A questão é: será que esses efeitos são sentidos da mesma forma por todas as pessoas? Pessoas que vivem em comunidades com pouca ventilação e sem acesso à água potável sentem mais os efeitos das ondas de calor do que aquelas com acesso a aparelhos de ar-condicionado. O que os estudos mostram é que as desigualdades previamente existentes podem ser agravadas pelos efeitos das mudanças climáticas.

Em países onde as mulheres têm menos acesso a ativos ou propriedades, mas cuja economia depende da produção da terra, elas também enfrentam maior dificuldade de acesso ao mercado de crédito. No caso de desastres, terão mais obstáculos para se reerguer e, assim, as desigualdades já existentes tendem a se ampliar. O resultado é um círculo vicioso: quanto mais as mulheres são afetadas por eventos climáticos adversos, maior é o nível de desigualdade.

Diversos estudos mostram que as consequências de eventos climáticos afetam mais as meninas do que os meninos. Um estudo realizado em Uganda revelou que a redução nos níveis de precipitação (seca) tem um impacto negativo significativo sobre a matrícula no ensino fundamental de meninas mais velhas, mas não afeta o desempenho ou a frequência escolar de meninos. Isso sugere que, em períodos de maior escassez de recursos, as famílias priorizam o acesso dos meninos a esses recursos e aumentam a utilização das filhas como mão de obra doméstica suplementar.

Em outro estudo, realizado na China, a autora Nancy Qian constatou que o aumento relativo da participação feminina na renda familiar eleva as taxas de sobrevivência das filhas, enquanto o aumento da renda masculina reduz essas taxas e o nível de escolaridade das meninas.

O estudo “Climate Change and Gender Equality in Developing States”, publicado em 2018, investiga se eventos climáticos podem afetar a igualdade de gênero, tanto no aspecto econômico quanto na evolução dos direitos sociais. O autor analisa esses efeitos em países em desenvolvimento, inclusive no Brasil, no período de 1981 a 2010. Os resultados encontrados corroboram outros estudos, ao mostrarem que choques e desastres climáticos impactam negativamente a igualdade de gênero e estão associados a retrocessos nos direitos econômicos e sociais das mulheres. Esses efeitos são mais intensos em países menos democráticos, com maior dependência da agricultura e com menores níveis de desenvolvimento econômico.

Nesse contexto, os compromissos internacionais assumidos pelos países ganham ainda mais relevância. Em 2015, a Assembleia Geral das Nações Unidas adotou metas de desenvolvimento sustentável a serem cumpridas até 2030, conhecidas como Agenda 2030. Um dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, o ODS 5, visa alcançar a igualdade de gênero e empoderar todas as mulheres e meninas. Esperamos que, apesar das dificuldades, os países persigam essas metas.


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