Pensei que o preconceito contra os baianos em São Paulo tivesse acabado. Em décadas passadas, ouviam-se referências perversas ao povo nordestino atreladas ao mau gosto e à miséria. Falava-se em baianada para se referir a alguma coisa errada ou feita por gente desqualificada. Isso parecia algo superado.
Mas acho que me enganei. Em pleno século 21, há gente com um pensamento desnorteado que ainda vê os baianos de forma pejorativa, como símbolos do migrante indesejado. É parecido com o que acontece no Rio de Janeiro com os paraibanos. Os nordestinos foram fundamentais para a construção e o desenvolvimento das duas cidades, mas ainda são alvo de ressentimento e incompreensão por parte de certos grupos.
Reproduzi nas minhas mídias sociais um vídeo e um texto publicado na Folha sobre a favela do Moinho, localizada entre os bairros dos Campos Elíseos e do Bom Retiro, e houve alguns comentários contra os baianos e pessoas de outros estados, como se eles fossem invasores e oportunistas que se aproveitam das políticas públicas oferecidas em São Paulo. Seguem três deles:
“Sai da Bahia para ganhar apartamento em São Paulo. Até eu quero. Só que o paulistano não vai ter essa sorte.”
“Eles têm que voltar para seus respectivos estados. Voltem para a terra de vocês, cambada.”
“Invadiu a área? Tem que sair e voltar para a Bahia.”
Na favela do Moinho há pessoas de todos os tipos e origens. Ela está sob ameaça de remoção pelo governo e seus habitantes tentam garantir seus direitos à moradia e reivindicam condições justas para deixar suas casas. Ninguém quer voltar para seu estado ou ir para a periferia. Fizeram suas vidas no centro de São Paulo e se tornaram paulistanos.
O preconceito contra os nordestinos se confunde com a aversão à pobreza, chamada de aporofobia, e com a repulsa aos moradores de favelas, tratados de maneira generalizada como pessoas que não trabalham e traficam drogas. Chamar alguém de baiano ainda é uma forma de ofensa para alguns cidadãos de classe média e alta, que, possivelmente, passam suas férias na Bahia.
O pior dessa história é pensar que evoluímos pouco. Mesmo que em público muitos paulistanos evitem demonstrar aversão aos nordestinos ou ironizá-los, na intimidade do lar a situação muda. Há aqueles que se liberam nas mídias sociais. O tempo passou, os baianos venceram, conseguiram prosperar nos seus negócios, colocaram seus filhos na universidade e certos indivíduos não se conformam com isso e idealizam uma sociedade pura sem a presença do migrante.
Curioso é a xenofobia resistir em uma cidade tão plural como São Paulo, onde o mundo do trabalho iguala a todos. Não é mais aceitável, numa terra de oportunidades, que os trabalhadores de outros estados sejam tratadas como um estorvo.
Confesso que fiquei escandalizado com os comentários feitos acima por alguns leitores do meu texto sobre a favela do Moinho. Há neles um estranho sentimento de revolta, como se a metrópole tivesse sido invadida, quando, na verdade, ela só se enriqueceu com a mistura de culturas.
Determinadas ideias são repulsivas e já deveriam ter sido banidas da mentalidade da população. Pelo que se vê, porém, não é o que acontece. O preconceito persiste de maneira insidiosa entre muitos bem e mal nascidos que ainda veem os nordestinos em geral e os baianos em particular como uma ameaça. Falta empatia a essa gente.
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