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Apertem os cintos: agora ‘Vale Tudo’ começou para valer – 12/05/2025 – Thiago Stivaletti

São Paulo

“E ‘Vale Tudo’, hein? Vocês estão vendo? Eu ainda não comecei, mas não paro de receber memes”. A frase inocente de um amigo outro dia, incluindo um promissor “ainda”, foi a confirmação de que o remake da melhor novela de todos os tempos pode não ser um sucesso absoluto de audiência, mas já dominou as redes e os grupos de conversa.

Só a partir dos últimos capítulos é que começamos a entender. Até agora, vimos só uma grande apresentação dos personagens, e o conflito para valer começou há poucos dias –mais exatamente quando Odete Roitman bateu de surpresa na porta de Maria de Fátima para lhe propor uma grande aliança do mal.

Em troca de a influencer conseguir separar sua mãe Raquel de Ivan para este ficar livre para Heleninha, a poderosa empresária vai agir para que seu filho Afonso largue a “insolente mocinha Duprat” para se casar com a víbora.

Para quem se lembra bem da novela de 1988 ou está revendo em paralelo na internet, é interessante notar algumas mudanças significativas que a autora Manuela Dias está fazendo no original de Gilberto Braga. Como o remake terá 40 capítulos a menos, algumas tramas foram adiantadas e outras atrasadas.

Em 1988, quando Odete propõe a aliança do mal a Fátima, esta já está namorando Afonso, depois de grandes tramoias para separar o playboy de Solange. Agora, a aliança foi feita quando Afonso e Solange ainda estão super apaixonados. Ou seja: talvez agora Odete participe mais ativamente do término do namoro do filho.

A mala da discórdia

Outra trama que pegou fogo nos últimos dias é uma das mais famosas da novela, e aquela que fala mais diretamente ao tema central da história: a mala com US$ 1 milhão que Marco Aurélio desviou da TCA, e que sem querer foi parar na casa de Raquel.

Para provar que dinheiro afeta a vida de qualquer cidadão, a mala é o grande pivô do conflito entre Raquel e Ivan: ela quer devolver a fortuna a Marco Aurélio a qualquer preço, enquanto ele quer lavar a grana e aproveitar a bênção que caiu do céu. Com Fátima botando a mão no dinheiro a partir de hoje, é esse conflito entre honestidade e jeitinho brasileiro que vai disparar uma série de outras tretas a partir de agora.

O racismo de cada dia

E quanto aos memes? Odete, sem dúvida, é a campeã, com suas frases lendárias contra o Brasil e os filhos bananas. O cabelo de Cassandra de Débora Bloch não mete medo como as sobrancelhas arqueadas de Beatriz Segall, e seu francês não é tão liso quanto o da megera de 1988, mas Débora é uma grande atriz e está sabendo aproveitar cada boa cena. Desta vez, pudemos ver o bateu-levou entre ela e seu amante Martim, enquanto na original víamos apenas o olho roxo resultante da briga.

Pena que o veneno da milionária seja bastante diluído no remake por conta dos novos tempos. Uma das frases lapidares de Odete na famosa cena do jantar, “isso aqui é uma mistura de raças que não deu certo”, foi cortada porque falar em raça hoje em dia seria escancarar o racismo da vilã e de boa parte da elite branca. Não adianta: Odete segue sendo racista do mesmo jeitinho.

Outra mudança gigante: na primeira versão, Afonso (Cassio Gabus), um jovem dos anos 80, bebia uísque, fumava e aparecia bastante na TCA, empolgado com seu trabalho. Agora, Humberto Carrão só quer saber de correr na praia e na Lagoa e jantar com a namorada –outro dia apareceu na TCA cobrando uma nova sala a Marco Aurélio, mas depois nunca mais foi visto no batente. Não é à toa que a mãe quer mandá-lo de volta a Paris.

E nem todo mundo está amando, mas meu coração já foi conquistado por Paolla Oliveira. Sua insegurança no último grau e o teor desagradável dos seus porres já estão no mesmo nível de Renata Sorrah há 37 anos. E grandes cenas com ela ainda vêm por aí.


Thiago Stivaletti é jornalista e crítico de cinema, TV e streaming. Foi repórter na Folha de S.Paulo e colunista do UOL. Como roteirista, escreveu para o Vídeo Show (Globo) e o TVZ (Multishow)