A mais alta corte do país vai discutir anistia. A da ditadura e dos torturadores, não a de Bolsonaro. Editada em 1979, a lei ainda é objeto de incerteza: o crime de ocultação de cadáver, pelo seu aspecto permanente, estaria mesmo perdoado?
O filme de Walter Salles reacende um debate que poderia estar encerrado há décadas. O país já foi condenado pela Corte Interamericana de Direitos Humanos por não investigar os desaparecimentos do Araguaia.
Um dos processos, a ADPF 320, tramita desde 2014 no STF. Descansou por sete anos no gabinete do ministro Luiz Fux. Desde 2021 está na antessala de Dias Toffoli.
Pesadelos do arbítrio e da inflação sempre incomodam o sono de brasileiros.
Notícia da última semana, com 30 anos de atraso, o Supremo julga virtualmente perdas inflacionárias de planos econômicos dos presidentes Sarney e Collor de Mello: Bresser (1987), Verão (1989), Collor (1990) e Collor 2 (1991).
Na contramão da Constituição de 88, que impõe aparência moral para a coisa pública, a falta de transparência se instala no STF. Familiares de ministros advogam em causas judiciais milionárias. Não se sabe quanto recebem os ministros por palestra e os seus institutos pelos negócios que realizam por aí. Privilégios indenizatórios dos juízes se esparramam pela administração.
Em 2009, com atraso, o Supremo implodiu a Lei de Imprensa, inconstitucional. Um dos princípios estabelecidos é o de que “todo agente público está sob permanente vigília da cidadania”, que qualquer autoridade pode sofrer críticas contundentes ou ásperas: ainda que injustamente ofendido, a indenização estará presa à “cláusula de modicidade”.
Pois o Código Penal está na direção oposta. A pena de prisão é maior em caso de crime contra a honra do funcionário público.
Mais uma incursão no túnel do tempo, o Supremo está inclinado a contrariar o enunciado de 2009, validar a diferença corporativa, estimular autocensura e proteger a reputação de seus próprios integrantes.
É comum o direito de crítica esbarrar no exagero. A contundência faz parte do jogo e a avaliação da gravidade de eventual desatino retórico, falado ou escrito, é eminentemente subjetiva.
Os ministros Barroso e Gilmar Mendes já trocaram ofensas em plenário. O atual presidente da corte afirmava, em 2018, que Gilmar é “pessoa horrível”, uma “mistura do mal com atraso e pitadas de psicopatia”. Chegou a dizer que o colega “não tem patriotismo” e que está “sempre atrás de algum interesse que não o da Justiça”, “uma vergonha, um constrangimento”. Em outra oportunidade, disse que Gilmar muda “a jurisprudência de acordo com o réu” e que isso não é “Estado de Direito”, é “estado de compadrio”.
Possivelmente, um magistrado de inclinação corporativista enxergaria graves ofensas nas frases destinadas ao ministro do STF, punindo-as com rigor, desde que proferidas, é claro, por uma pessoa qualquer. Mas seria tolerante em relação ao tom áspero e rude adotado pelo interlocutor, também ministro do Supremo, pela ausência de dolo e pela emoção que costuma temperar controvérsias políticas e jurídicas.
A intangibilidade que o ministro Flávio Dino tanto deseja (“não me chamem de ladrão”) remete o Brasil para a década de 1940. Não faz sentido.
LINK PRESENTE: Gostou deste texto? Assinante pode liberar sete acessos gratuitos de qualquer link por dia. Basta clicar no F azul abaixo.